3.31.2003

É verdade



Notícias da guerra

Aconteceu outra vez. Como em todas as guerras, a primeira vítima da invasão do Iraque foi a Verdade. Ela foi ferida nos primeiros minutos de luta e quando deu entrada no hospital do Kuwait - ou num hospital de campanha montado dentro do território iraquiano, as versões divergem - já estava morta. Foi atingida por um solado iraquiano disfarçado de civil, por "fogo amigo" dos aliados, por uma mina terrestre iraquiana, por uma bala perdida de origem desconhecida, por um míssil disparado pelos americanos contra Bagdá que se perdeu e a feriu junto com outros dez inocentes, por um míssil disparado pelos iraquianos contra o Kuwait que também se perdeu e a feriu junto com outros 20 inocentes - depende de quem faz o relato. Era morena ou loira, alta ou baixa, magra ou gorda, casada ou solteira ou tudo isso ao mesmo tempo. Sacrificou-se pela libertação do povo oprimido do Iraque ou foi uma vítima da criminosa agressão ao povo do Iraque. Famílias diferentes foram notificadas da sua morte e brigaram pelos seus restos mortais, cada uma reivindicando o corpo para si, inclusive com documentos, certidões, fichas dentárias, etc., sem chegarem a um acordo. É sempre assim. Já se convencionou que só há uma maneira de saber ao certo de quem é, afinal, a Verdade: esperar o fim da guerra para que o vencedor possa, com calma, descrevê-la em detalhes, identificar sinais de nascença e velhas cicatrizes, e acabar com todas as dúvidas. A História mostra que nesses casos a Verdade era sempre do vencedor. E se não era, ficava sendo.